Geraldo Rufino morou na favela e trabalhou no lixão; hoje, ele é dono de uma empresa que fatura até R$ 50 milhões ao ano.
Um casal e oito filhos. O mais novo, Geraldo Rufino, brincava com os irmãos nos carros de boi da roça do pai, no interior de Minas Gerais. Não havia rádio nem televisão. "Era o brinquedo que tínhamos, e a vida era um paraíso" lembra Rufino.
Um paraíso que não durou. Um dia, uma forte geada se abateu sobre a plantação do pai de Geraldo, e tudo que tinham se foi. Não teve jeito, a família precisou se mudar para conseguir sobreviver, O destino foi a Favela do Sapé, em São Paulo. O menino, então com cinco anos, percebeu que a vida podia ser bem complicada. Além da pobreza, sofreu a primeira grande perda: a mãe de Rufino, que trabalhava como empregada doméstica, morreu de mal súbito. "Vi meu pai chorando. Eu perguntava para ele cadê a mamãe", e ele só chorava. Sentia um vazio no coração, parecia que estava faltando alguma coisa, mas não entendia o que estava acontecendo, relata.
Aos 11, começou a trabalhar em uma fábrica de carvão. Tempo depois, saiu do emprego e começou a recolher latas em um lixão próximo da favela na qual morava. Decidiu guardar o dinheiro que conseguiu dentro de latinhas, que enterrou em um terreno. Mas, uma obra foi realizada no local e enterrou de vez as economias de Rufino.
Aos 13 anos, Rufino começou a trabalhar no Playcenter. No início, teve dificuldades em se adaptar, pois uma chefe o aconselhava a não entrar na sala dos diretores - todos racistas, segundo ela. Rufino conta que acabou amigo de muitos e que descobriu que a gerente estava enganada. Acho que ela queria lhe proteger. Proteger e estimular. A mulher o fez voltar a estudar como condição para continuar no emprego. Deu certo. Rufino alçou o cargo de diretor do parque.
Enquanto ascendia na empresa, decidiu realizar um investimento paralelo: comprou uma Kombi e a deu a um dos irmãos para fazer carreto. Rapidamente o negócio evoluiu para dois caminhões. No entanto, ambos os caminhões se envolveram em um acidente simultaneamente, e Rufino acabou quebrando. Com os veículos danificados, decidiu desmontá-los para vender as peças e percebeu uma possibilidade de investimento. Era 1985 e nascia a seu próprio negócio, uma empresa de desmonte de caminhões que em 2013 faturou R$ 50 milhões. É uma empresa que gera oportunidades e contribui socialmente, descreve Rufino.
Rufino conta que, fora o período no qual acreditou que os diretores do Playcenter eram racistas, nunca sofreu nenhum tipo de discriminação. E mais: não se importa com a opinião dos outros. Se ele tivesse de nascer de novo, iria querer ser negro, acha um privilégio ser negro.
Também acredita que é preciso lutar contra a desigualdade, mas não crê que exista uma relação direta com a questão racial. Se você for hoje a uma favela, você vai ver tanto negros, como brancos, amarelos e loiros. Para vencer na vida, diz, é preciso superar o preconceito. Se você olhar para o passado, os negros não acreditavam neles, aceitavam a ideia de que eram menores. Os negros que acreditaram que eram iguais e formam hoje a minoria que se destaca tanto no meio empresarial como na política e no esporte, discorre. Se é possível o presidente dos Estados Unidos ser negro e ser querido, porque não é possível para os outros?
Rufino também não é favorável ao sistema de cotas. Acredita que é mais uma forma de discriminar. A cota tem de ser social, não racial. Não tem discriminação pior que essa. É uma vergonha mais uma vez colocar na cabeça do negro que ele é inferior. Acho uma humilhação, não uma oportunidade, argumenta. Em vez de cotas, defende Rufino, o que o jovem negro precisa é saber que tem competência e que pode sonhar como qualquer pessoa. Ele acredita fazer a sua parte, contando sua história e servindo de inspiração. Vou à periferia e converso com eles, digo é possível gente, olha eu aqui. Eu pude e todos vocês podem, vocês tem livre arbítrio.
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